
Ilustração: Loredano
O senhor vai votar na Dilma, né?
Por Miguel Arcanjo Prado*
Nesta sexta-feira, cheguei morto da redação em casa, gripado, cansado. Meu porteiro me aguardava em frente ao elevador com um sorriso todo simpático no rosto.
Logo pensei: aí vem piadinha pela frente, já que ele tem um humor que nem um tsunami consegue abalar. E qual não foi a surpresa quando ele vaticinou, num tom todo curioso:
- O senhor vai votar na Dilma no domingo, né?
Resolvi jogar pesado e não dei a certeza que ele tanto queria. Contestei com outra pergunta:
- Por quê?
Logo ele me pôs a explicar, num tom professoral.
- Porque ela vai continuar tudo o que o Lula fez pela gente, né? Se o outro ganha eu não boto fé... Muda tudo pra pior.
Fiz-me de rogado e quis saber qual seria esse tão aclamado feito do tal do Lula por todos nós. Ele continuou, mais empolgado e confiante.
- O Lula pagou toda a nossa dívida. Porque antes só queriam ir lá no estrangeiro e pedir emprestado para colocar tudo no bolso. O Lula, não. Ele pagou tudo. A gente agora não deve nada a ninguém.
Continuei dando corda. Seu João respirou fundo e prosseguiu o discurso.
- Agora a gente tem emprego, né. Eu mesmo, já fiquei muito na fila do desemprego e sei como é. E os pobres estão todinhos de barriga cheia. Antes era aquela fome, a gente não conseguia comprar biscoito e iogurte pros meninos. Agora dá para comprar.
Resolvi bancar o indignado e disse que, apesar disso tudo, ainda faltava melhorar muita coisa. Para minha surpresa, seu João concordou.
- Sim, falta muita coisa. Mas o Lula já deixou tudo no ponto para ela fazer. Agora, se o outro ganha, eu não sei não...
Ao ver que o elevador chegava no térreo, ele lembrou-se de satisfazer a sua curiosidade inicial.
- Mas o senhor, “seu” Miguel, vai votar na Dilma domingo, né?
Resolvi terminar logo com aquele sofrimento, até porque estava louco para subir, tomar um banho, comer e me atirar no sofá da sala para ver o debate da Globo debaixo das cobertas. Enquanto entrava no elevador, respondi:
- Vou, sim, seu João. Vou votar na Dilma. E sabe por quê? Porque eu assino embaixo em tudo o que o senhor disse.
*Miguel Arcanjo Prado é jornalista e fica feliz quando descobre que pessoas a quem admira têm uma visão de mundo parecida com a dele.