domingo, 20 de junho de 2010

Coluna do Miguel Arcanjo nº167

Viva São João!

Por Miguel Arcanjo Prado*




Bandeirinhas coloridas – em tempos de Copa, verdes e amarelas –, como nas pinturas de Volpi (na foto, acima), são a cara dos festejos juninos. Com o São João às portas, resolvi passar o restinho que sobrou do domingo após a vitória do Brasil em cima da Costa do Marfim em um lugar que tivesse cheiro de quentão.

Como não sou bobo, corri para o largo Padre Péricles, onde fica a Igreja de São Geraldo das Perdizes, bem ao lado da casa da minha irmãzinha em São Paulo, a jornalista Gabriela Quintela. Lugar como esse não há. Nem parece São Paulo nesta época do ano. Tem jeito de interior.

Além do cheiro onipresente de quentão, barraquinhas de comidas típicas – as mais deliciosas gostosuras já feitas – circundam o largo, com um palco ao fundo. Nele, uma animada banda de forró comanda a noite ao som de clássicos de Gonzagão. Nem a moça do pastel resiste à boa música e balança no ritmo sem-vergonha enquanto prepara sua fritura.

E para os amantes do bom tacho, como o é todo mineiro, tem canjica, arroz doce, mingau de milho verde, broas e bolos variados, cachorro quente, churrasquinho... É mesmo o paraíso. E o melhor: os preços são justos. Uma cartela de R$ 15 em fichinhas ainda dá direito a concorrer a uma prenda – adoro essa palavra junina.

O clima estava tão gostoso que até pensei por algum momento estar numa das barraquinhas do bairro da minha infância em Belo Horizonte. Tudo tem gosto de felicidade.

Se você está em São Paulo e não é bobo, fica a dica: a quermesse no largo Padre Péricles vai até o dia 4 de julho, todos os sábados e domingos, a partir do pôr-do-sol. Se não está em Sampa, não se preocupe. Corra para a quermesse mais próxima. Com certeza há de ter uma e você será feliz.

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Caio Silva, meu primo tão querido, passou o verão em Salvador da Bahia e me trouxe de lá dois discos fundamentais. O primeiro é um compilado pirata de todos os sucessos do Olodum, sobretudo aqueles dos primeiros tempos da banda filha do gênio Neguinho do Samba. É de impressionar até hoje não só a força do ritmo do grupo, mas as letras cheias de inteligência, consciência e protesto.

O outro disco é de Jauperi (na foto, abaixo), uma das melhores coisas que a Bahia produziu nos últimos tempos. Além da voz cativante, ele fez versões lindas para músicas como Alegria, Alegria, de Caetano, e Drão, de Gil. Jauperi mostra competência como compositor em faixas como Cidade dos Poetas e Sandália de Couro. Quem pensa que a Bahia só produziu cantoras ultimamente está redondamente enganado. Jauperi vai longe.




*Miguel Arcanjo Prado é jornalista e gosta de canjica e arroz doce.

sábado, 5 de junho de 2010

Coluna do Miguel Arcanjo nº 166

O significado da derrota de Martinho da Vila na ABL

Por Miguel Arcanjo Prado*



A Academia Brasileira de Letras, a ABL, instalada no pomposo palácio do Castelo, na região central do Rio, elegeu nesta semana seu novo membro. Aos 71 anos, o diplomata e escritor pernambucano Geraldo Holanda Cavalcanti abocanhou a cadeira de número 29. A vitória foi bonita, com 51% da preferência dos acadêmicos: dos 39 votos possíveis, recebeu 20. Mas o mais intrigante dessa eleição dos imortais não está no vitorioso, mas, sim, na lista dos que ficaram de fora.

Além de Cavalcanti, concorriam também o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro Muniz Sodré, o ministro do Supremo Tribunal Federal Eros Grau, e o sambista Martinho da Vila. É aí que mora o x da questão. Dos 19 votos que sobraram, Grau ficou com dez, e Sodré, com oito. O último foi em branco. Martinho não recebeu um votozinho sequer. Isso mesmo, o mestre do samba da Vila Isabel não conseguiu convencer nem o mais gagá dos velhinhos da ABL a depositarem seu nome na urna. E isso mesmo depois de levar a bateria da Vila Isabel para uma animada roda de samba no Palácio Trianon promovida em parceria com o presidente da casa, Marcos Vilaça. Nem isso foi suficiente para modernizar as velhas cabeças responsáveis pela língua brasileira.

Ao não votar em Martinho, a ABL manda um recado. Considera-se bem distante – e, por que não?, bem melhor – do que essa culturazinha inferior feita por gente pobre – e preta – exemplificada pelo samba de Martinho da Vila. A razão da não-eleição do compositor da zona norte é a mesma que fez a ABL rejeitar por duas vezes o jornalista negro e homossexual João do Rio (1881-1921), que só conseguiu a vitória em sua terceira tentativa, há exatos cem anos. Em sua posse, atrevido como só, fez questão de não usar um fraque qualquer – mandou costurar uma vistosa vestimenta, instituindo o famigerado fardão. Quem sabe na terceira tentativa Martinho não tem a mesma sorte que João do Rio? Resta sonhar.

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Mesmo falando as mesmas coisas que já havia dito quando voltou à TV, no dia 8 de março último, Hebe Camargo, aos 81 anos, é a entrevistada da volta de Marília Gabriela ao SBT neste domingo e da revista Veja desta semana. Pouco importa que não seja material novo. O que interessa é que ela tem uma vontade de dizer a todo mundo o quanto ama a vida. No ano passado, na semana em que completou 80 anos, Hebe me deixou isso claro enquanto conversávamos em seu camarim no SBT. Rindo à beça, contou-me que comemoraria o aniversário na Disneylândia. Quando nos despedimos, fez questão de apertar minhas bochechas, me chamando de “gracinha” – coisa que costuma fazer sempre que nos encontramos nas pautas da vida. Dá gosto ver Hebe celebrada e saltitando por aí nas festas paulistanas. Dá orgulho de ser contemporâneo desta mulher, mesmo ela tendo nascido em 8 de março de 1929 e eu, em 3 de dezembro de 1981. Dá vontade de acreditar que Hebe vai durar para sempre. Oxalá.

*Miguel Arcanjo Prado é jornalista e não tem muita paciência para velhinhos conservadores.

PS. Abaixo, uma belo registro do carisma de Hebe feito pela minha parceirinha de pauta, a fotógrafa Julia Chequer, para o R7, no dia em que ela voltou à TV: