"No hay monedas"
Por Miguel Arcanjo Prado*
Não há moedas. Esta é a frase mais recorrente em estabelecimentos comerciais de Buenos Aires. Não apenas na capital, como por toda a Argentina, elas são artigo de luxo. Balançá-las no bolso ou, atrevimento maior, mostrá-las em público, logo atiça olhares de cobiça. Na Argentina de hoje, quem tem moeda é rei. E quem paga com moeda vira herói. Por pouco, os comerciantes não beijam o cliente tão desprendido de valores materiais.
Moedas são fundamentais no cotiano portenho. Para pagar os coletivos, como são chamados os ônibus de Buenos Aires, é preciso tê-las. Para telefonar usando um orelhão também. Acho que, por isso, os locutórios --casas com telefones de aluguel onde se pode pagar com nota, se o valor da ligação ficar acima de um peso-- são sucesso.
Ponto de ônibus é lugar onde se pode ver o sofrimento de quem descobre, na fila, que não tem moeda suficiente para o embarque. Porque não adianta reclamar: notas não são aceitas para o pagamento de passagens. Para não ficar a pé é preciso se virar.
Quem lucra com o desespero é o velho mercado negro. Há quem receba dez pesos em nota e devolva apenas oito em moedas. E muitos argentinos acham isso vantajoso, já que não dá para viver sem elas. No banco, apesar da lei que obriga as agências a trocarem até 20 pesos em moedas, consegui-las é praticamente impossível. Assim como o comércio, eles juram que não têm.
Eu mesmo só consegui trocar 10 pesos na agência do Banco do Brasil da Sarmiento, no centro de Buenos Aires. Isso porque sou cliente do banco e, claro, estrangeiro, já que, como aqui, eles valem muito lá também. Depois, com meus dez pesos em moedinhas, tornei-me quase um General San Martín, digno de contar a proeza em praça pública. Os argentinos que ouviram minha façanha contaram, decepcionados, que nunca conseguiram trocar mais do que cinco pesos por moedas nos bancos locais. E isso depois de insistirem muito.
O Banco Central da República Argentina garante que há mais de cinco bilhões de moedas em circulação no país. O que daria mais de 130 para cada um. O problema é que ninguém acredita nisso. Há quem diga que a maioria possa ter caído nos bueiros da cidade. Outra turma pensa que boa parte pode ter sido derretida, por conta do valor do metal. Um gerente de banco chegou a afirmar ao jornal "O Clarín" que a culpa é dos turistas estrangeiros, que levam as moedinhas argentinas para seus países como suvenir. Tem cabimento?
Os supermercados, que não aguentam mais pagar caro por moedas para dar troco aos clientes, querem implementar, já no próximo mês, um cartão no qual o troco miúdo será convertido em bônus para as próximas compras. Há quem ache um abuso, mas diante do caos a iniciativa é compreensível assim como é de se espantar que os ônibus da capital argentina não trabalhem com bilhete eletrônico.
Mas como lá também existe lei do consumidor, mesmo com o tal cartão nos supermercados, quem quiser ter moedinhas de troco permanece com o direito. Até porque ir com uma nota de dois pesos --a de menor valor-- e comprar algo de 50 centavos, para ter o restante em moedas, é um truque frequente de nossos hermanos, que, de bobos, não têm nada.
*Miguel Arcanjo Prado é jornalista e, recentemente, passou 20 dias em Buenos Aires, nos quais jamais ficou sem as valiosas "monedas".
Fotos: Divulgação e Thomas Locke Hobbs
domingo, 17 de maio de 2009
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7 comentários:
Muito bom, Miguel!
Conte-nos mais sobre esta sua passagem por Buenos Aires.
; )
Interessante... E pré-histórico também! É bom saber disso. Quando for à Argentina levarei todos os pesos em "monedas". Rsrsrsrsrs. Nos Estados Unidos também é muito parecido. Para usar orelhão por lá vc tem que ter moedas de 10, 25 ou 50 centavos, sendo que estas últimas, as de 50, são raridade. Para lavar roupas nas lavanderias, necessita-se dos preciosos quarters, moedas de U$ 0,25. Ou seja, juntar quarters significa garantia de roupa lavada na quinzena. Rsrsrsrsrsr. É cômico, para não dizer ridículo.
Abraço,
Danilo.
Uepa!
Pura verdade... Outro dia lá, tive de comprar uma Coca-cola para "ganhar" moeda de troco.
Nossa, além de jornalista, você também é um cronista de talento.
Parabéns.
PS: Nunca tive nada contra moedas.
Ótimo texto, Miguelitos!
Ainda mais para quem, como eu, conhecerá Buenos Aires em breve.
Abração, grande amigo!
Maurice.
que interessante Miguel!
bela historia!
e vc ainda se saiu bem,né?rs....
espero q a viagem tenha sido bacana e que esteja tudo bem por ai.
grande abraço!
MIGUEL, vc tem que escrever todas aquelas historias que nos contou neste fim de semana! a argentina é o mar que voce teve o prazer de tomar um caldo... ou foi sopinha...rs!
ate dia 06 irmaozinho... Gabriel Prado.
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